Diário Pico Zen - Dia 2
26/04/2025

O dia começou cedo, muito cedo. Eram 7h10 da manhã quando abri os olhos e, quase por instinto, saltei da cama para espreitar a montanha. E lá estava ela — majestosa, imponente, sem uma única nuvem a esconder-lhe a beleza. Sorri, inevitavelmente. Vieram-me à memória tantos despertares vividos ao longo dos quatro anos que passámos no Pico. Cada manhã era uma celebração silenciosa. Hoje não foi diferente. Ver a montanha é um presente. Costumo dizer que vir ao Pico e não vê-la é como ir a Roma e não ver o Papa — com a diferença de que é mais certo ver o Papa do que a nossa montanha. Deixo o meu conselho de quem a teve como vizinha durante anos: as melhores horas para contemplá-la são ao nascer e ao pôr do sol.
A Maria Beatriz só despertou umas horas depois. Entre o meu acordar e o dela, houve tempo para um banho reconfortante e para a escrita do primeiro diário. A manhã seguia serena.
Por volta das 9h40, com o pequeno-almoço tomado no restaurante da Furna — aquele cantinho já tão nosso —, estávamos prontas para a primeira atividade do dia: a inauguração de um novo trecho do grande trilho da Prainha do Norte. O grupo era composto por mais de 40 pessoas — adultos, crianças, sorrisos, e um caminho por descobrir. A ligação entre nós formava-se sem esforço, através do chão que pisávamos e do ar que respirávamos.
De regresso à Furna, esperava-nos mais uma refeição deliciosa — vegan, colorida e cheia de vida. Já vos disse que esta cozinha é uma das minhas paixões no festival?!
Depois do almoço, o ritmo abranda. A Maria Beatriz foi ter com as amigas do Pico, enquanto eu me deixei guiar pela curiosidade até uma sessão de constelações sistémicas, com a terapeuta Elisabete Soares. Já tinha lido sobre o tema, mas esta foi a minha primeira experiência ao vivo. Não sou crente, nem descrente; não sou céptica, sou curiosa. E foi com esse espírito aberto que me juntei a um grupo de doze pessoas, deitadas sob as árvores, num tapete confortável, embaladas por um sol morno e acolhedor.
A sessão começou com uma meditação guiada. A certa altura, perdi-me entre pensamentos e sensações — uma pequena sesta inesperada, talvez. Quando despertei, o ambiente era de paz absoluta. Foi então que se iniciou a constelação — e a constelada fui eu. Confesso: sair da zona de conforto não é fácil. Mas foi, sem dúvida, enriquecedor. Senti vontade de aprofundar este conhecimento. Afinal, somos energia em movimento, átomos em permanente conexão.
Ainda no parque de campismo da Furna, era tempo de mais uma atividade. Desta vez, Yoga Aéreo com a Célia Pimentel — a facilitadora de Coimbra que já nos tinha guiado no dia anterior. Penduradas em tecidos suspensos, deixámo-nos balançar, alongar e libertar, ao som do teste de som das Línguas de Fogo, acompanhadas pelo trio de Zeca Medeiros.
E então lembrei-me: hoje é 25 de Abril. Um dos dias mais importantes da nossa história. Fiz uma breve passagem pelas redes sociais, mas logo voltei ao momento presente — sair da bolha zen é, muitas vezes, desolador. Preferimos celebrar a liberdade ali, em comunhão.
À noite, vamo-nos juntar para ouvir poemas de Natália Correia — poeta, política e mulher revolucionária dos Açores.
Seguimos para o jantar e, de barriga cheia e alma em festa, preparámo-nos para a grande celebração. A noite superou todas as expectativas: duas horas de música açoriana da mais alta qualidade, cantigas que tocaram fundo, num ambiente de alegria e união genuína.
Já passava da meia-noite quando regressámos a casa. A Maria Beatriz adormeceu num instante — um sono profundo, tranquilo, merecido. Eu segui-lhe o exemplo. Dormimos felizes.
Daniela Silveira
Gestora Cultural